sábado, 13 de outubro de 2012

Corpolatria

                                      
A “Corpolatria” é uma espécie de “patologia da modernidade” caracterizada pela preocupação e cuidado extremos com o próprio corpo não exatamente no sentido da saúde (ou presumida falta dela, como no caso da hipocondria), mas, particularmente no sentido narcísico de sua aparência ou embelezamento físico.

Para o corpólatra, sua imagem refletida no espelho se torna obsedante, incapaz de satisfazer-se com ela, sempre acha que pode e deve aperfeiçoá-la. Sendo assim, a corpolatria se manifesta como exagero no recurso às cirurgias plásticas, gastos excessivos com roupas e Marcas, tratamentos estéticos, abuso do fisiculturismo (musculação), uso de Anabolizantes, etc.

A sociedade pós-moderna é seduzida pela mídia com propostas de mercado, interessado na constante insatisfação e na renovação

Na cultura ocidental há um grande investimento na auto-imagem. O corpo “belo” é considerado uma mercadoria poderosa, cara. O olhar passa a ocupar lugar central – é o mundo das imagens, das aparências. O ter passa a ser sinônimo de reconhecimento do sujeito pelos outros. O sujeito perde-se em sua própria imagem, não dando conta das suas relações com o outro, pois amar implica em sacrificar um fragmento de seu narcisismo, enquanto ser amado implica em ser visto e apreciado.

As condições de vida transformam também as instituições, a escola, a religião, a política, sobretudo a família e estas, por sua vez, modelam a estrutura do sujeito, favorecendo o afloramento de traços narcisistas, presentes em muitos de nós. Todavia, é indispensável compreender que o processo se dá em via de mão dupla, pois contribuições individuais terão, por sua vez, o efeito de realimentar o que Lasch denominou cultura do narcisismo.

Em cada época, sem se dar conta, o homem é tragado pelo social e produz sintomas determinados por essa cultura.

Visto que em nossa sociedade a corpolatria encontra-se em evidência, nesse espaço – o corpo – é onde os sintomas afloram.

Na era atual, cujas idéias são pautadas por exigências da sociedade de consumo, que promove a ilusão da liberdade individual irrestrita, o mal-estar assume muitas vezes formas de apatia, vazio interior, solidão e fracasso. "Para esses deprimidos, existe o “eu” ideal e o “eu” real, que se encontram muito distantes um do outro.

Cristopher Lasch, conhecido historiador americano, anunciou a substituição das neuroses sintomáticas por desordens de caráter, caracterizadas pelo narcisismo patológico relacionadas por ele á mudanças específicas na sociedade. Diz o autor que a alteração do sentido do tempo, intenso temor ao envelhecimento e à morte, fascínio pela celebridade, deterioração das relações entre os homens, declínio do espírito lúdico, negação feroz da dependência ao outro, são alguns dos padrões característicos da cultura contemporânea, fortemente narcísica.

As patologias narcisistas: neo-sexualidades, drogadição, enclaves autísticos, bulimia, anorexia, doenças psicossomáticas, etc, revelam a tentativa de preencher o vazio que cada vez mais se aprofunda quando faltam experiências reais, genuínas e autênticas suficientes para encurtar a distância que separa os dois ‘eus’ (ideal e real).

No entanto, há de se ter o cuidado em não se postular esses quadros patológicos como apanágio exclusivo da pós-modernidade. Há relatos anteriores ao advento da modernidade sobre eles, porém, hoje é reconhecida sua maior freqüência

Temos observado mudança significativa no perfil clínico dos nossos pacientes, com aumentos relevantes de casos de depressão, síndrome do pânico, fobia social, Transtorno Obsessivo-compulsivo, Obesidade, Vigorexia ou Overtraining, também chamado romanticamente por Síndrome de Adônis, etc, sendo esta última, a Vigorexia, uma das mais recentes patologias emocionais estimuladas pela cultura, não tendo sido, ainda, catalogada como doença específica pelos manuais de classificação (CID.10 e DSM.IV).

O que há de comum entre essas patologias é a expressão no corpo. Corpo que se traduz ora pelo excesso de ações, caracterizado pela voracidade e pelos comportamentos compulsivos, ora pela ausência de ações, impedido de agir pela angústia (pânico), ou prostração e desânimo (depressões).



Profa. Dra. Edna Paciência Vietta

Psicóloga Clínica



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